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Doutor Estranho e Hellblazer - O Estranho e o Louco # 02

Por Dell Freire

Magnum Opus

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— Devagar, Eliphas — a mãe puxa o velho com força e afasta os estranhos pensamentos de seu menino.

Tá! — Diz o jovem, irritado. — Não sei porque ele ainda não morreu!

— É o Mal. — diz ela, debaixo de seus cinqüenta anos, como se isso explicasse tudo.

O homem caminha com extrema dificuldade, amparado pela esposa e o filho reclamão em cada um dos braços. O Mal de Parkinson corrói implacavelmente seu cérebro a cada segundo. Outrora imponente, ele agora tem as pernas enrijecidas e suas mãos agitam-se em movimentos involuntários e desconexos. O corpo que transpirava Ordem, hoje exala Caos.

— Ihnn... já.... Ihnn... já.... — anuncia, sentado em sua cadeira após a ajuda.

Ele não pára de tremer, sua boca amolecida pela doença começando a babar.

— O quê? Fala mais alto, velho doido! — impacienta-se o jovem Eliphas.

— Ihnn... já.... Ihnn... já.... — agitando-se ainda mais.

— Ele quer mijar — explica Mildred, a esposa.

Já acostumada a interpretar os resmungos, como uma velha bruxa a entender a língua dos demônios, ela abaixa as calças de seu decrépito companheiro, coloca o pênis sujo em frente a um urinol e aguarda que ele esvazie a bexiga.

— Daqui a pouco ele volta ao normal — observa Eliphas, a mão apoiada na parede.

— De dia desanda e de noite anda. É o Mal.

Saindo de perto de Mildred, o menino caminha para seu quarto. Sentando-se em sua cama, olhando para o teto acinzentado, ele segura o livro de feitiços intitulado O Pequeno Alberto contra o peito. Nele reside toda a esperança de, algum dia, ser um novo homem. Em seguida levanta-se, fecha a porta e começa a lê-lo em voz baixa.

— Não há a mais remota possibilidade deste livro ser verdadeiro — diante das câmeras, o doutor Terry Thirteen acende seu charuto. — Coisas assim já teriam vindo a público caso fossem verdadeiras. É pura teoria da conspiração sem sentido achar que a Igreja esconderia um livro tão importante. Esse diário, esse Apocryphon, é uma lenda clássica no mundo do Ocultismo e, cedo ou tarde, eu sabia que algum espertinho viria com uma fraude dessas. Não há, repito, não há o menor indício de que o diário de Cristo esteja entre nós.

— Bem, essa é a sua opinião, Dr. Thirteen — John Constantine interrompe o apresentador de TV, que mal se manifesta. — Você sempre teve o mau hábito de achar que ela serviria à todos...

— Meus anos de experiência...

— ....por favor, doutor! Não me venha vomitar seu conhecimento em cima do meu sobretudo; acabei de lavá-lo — Constantine acende seu cigarro. — Se essa porra de livro existir mesmo, nada vai mudar. Nada.

— Mas não existe...

— E se existir? Porra, Thirteen, há milhares de anos que vemos os mistérios acontecerem no nosso cotidiano e isso nunca mudou nossas vidas!

— Senhor Constantine. Surpreende-me que um homem adulto como o senhor acredite em feitiçaria; são velhos hábitos de camponeses incultos... Busca-se o demônio pra se ter uma boa lavoura, pra se espantar os lobos. Crendice popular que não condiz com a vida urbana. A magia não existe!

— Ela nunca existirá se você assim preferir...

— Pois prove-me que essa tão propalada magia existe. Faça-me levitar, mago!

— Com todo o prazer!

Em um gesto rápido, Constantine voa sobre o Doutor Thirteen com fúria, arremessando-o para fora de sua cadeira. A câmera acompanha a violenta briga entre os dois, enquanto um diretor apressa-se em gritar.

— Chega! Chega! Alguém segure esses malucos!

— Eu passo — Mister Io se afasta, enquanto a nuvem branca foca a briga de Constantine.

— Acalme-se, Io — o Dr. Oculto segura o amigo pelo braço. — Você sabe que ele é o mais indicado!

— Vão sozinhos! Comparado a vocês, sou um zero à esquerda!

— Muito engraçado, Io... Você sabe que precisamos de você — o Vingador Fantasma fica imóvel, olhando para a briga gratuita que ocorre distante. — Certas coisas só funcionam com um número exato. Você sabe disso. Se não ficar ao nosso lado, não o convenceremos.

— Temos tantas possibilidades... Já pensou no Etrigan? — pergunta Io.

— Intempestivo demais — descarta o Vingador.

— Tem também o detetive...

— Hellboy? Pelos nossos parâmetros, ele é apenas uma criança, Io. Acredite.

— Para o bem ou para o mal, precisamos de Costantine — intervém o Dr. Oculto. — Não há outro que...

— O Motoqueiro?

— Ele já tentou pegar o Apocryphon por motivos próprios. Não é confiável — relembra o Vingador Fantasma.

— Facilite as coisas, Io. Não há alternativas.

— Muito bem, Oculto — contrariado, Mister Io se dirige aos outros dois. — Se acham tão importante que o encontremos, que assim seja.

— Perfeito! — Contendo o sorriso, o Vingador Fantasma ergue a sua capa e se transporta para a Terra, acompanhado por seus dois aliados.

— Como assim "a fita está em branco"?

Enquanto o diretor do programa agita-se de um lado e para o outro, John Constantine está em frente à pia do imenso banheiro da rede de televisão, terminando de lavar os hematomas em seu rosto, quando uma mão enluvada se apóia em seu ombro.

— Merda! — Diz o mago, sem se virar. — O que eu tenho de fazer pra me livrar de vocês?

— Precisamos de você, Constantine.

— E pra que vocês servem, afinal? Não fazem nada sozinhos!

— O Caminho do Diabo está sendo aberto à força e cabe a nós impedir que muitos o trilhem.

— Não vai me dizer que é esse lance do Apocryphon, é?

— Exatamente, John — afirma o Dr. Oculto. — Há anos ele foi aberto, e agora este livro pode vir a ser a chave fundamental pra que se acabe a divisão definitiva entre o Bem e o Mal.

— Com o bandido ganhando no final, dessa vez.

— Encontre o livro, John — pede o Vingador Fanstasma — e entregue-o a nós antes que alguém descubra os seus segredos.

— E suas mentiras...

— Não olhe para mim — Mister Io ergue uma das mãos. — Duvido do valor desse livro tanto quanto você e sinto tanto prazer em olhar pra essa sua cara cínica quanto você a mim.

— A mesma simpatia de sempre... E o que eu ganho se me juntar a vocês novamente?

— Não seremos seus companheiros de viagem desta vez — diz o Vingador Fantasma. — Outro homem que domina as artes místicas irá acompanhá-lo no momento oportuno. Por enquanto, terá que trilhar esse caminho sozinho.

— Pelo visto não devo ganhar nem um muito obrigado... Por onde começo?

Enquanto Eliphas começa a varrer a poeira para fora de seu quarto, uma pequena sensação o incomoda, como se algo que há muito temesse estivesse prestes a acontecer. Com um gesto rápido, o jovem se tranca no recinto, antevendo a visita de alguém indesejado. Ele respira fundo, as costas encostadas contra a porta.

Na cama, John Constantine acorda e começa a se vestir. Ao seu lado, o espaço vazio.

— Acordou tarde, John — Zatanna surge nua, caminhando até ficar ao lado do amante. — Mas não vá se acostumando. É só uma homenagem aos velhos tempos. O que quer?

— Ei, de onde você tirou a idéia de que eu estou a fim de alguma coisa?

Ela o encara por alguns segundos, esperando a resposta.

— Tudo bem, tudo bem. Estou atrás do Apocryphon... Me disseram que você tem a resposta.

— E dormir comigo foi o quê? Um bônus?

— Você sabe que não, amor — Constantine acende um cigarro.

— Bem, eu já desconfiava que o queria.

— E?

— Ele estava comigo, realmente — Zatanna volta para a cozinha. — E imaginei que era de seu interesse. Infelizmente, não o tenho mais comigo. Uma noite ele simplesmente... — ela retorna e não encontra mais ninguém — ... desapareceu.

A pele de Eliphas começa a transpirar, possivelmente pelo nervoso e o medo iminente. De repente ele pega seu livro, O Pequeno Alberto, e o coloca sobre o peito. Talvez para usá-lo como escudo contra alguma força invisível. Ele abre a porta de seu quarto, em meio a sussurros que teimam em surgir em sua mente. Em desabalada carreira, o jovem bruxo sai correndo pela rua, o trovão e a chuva fazendo surgir pequenos demônios em sua mente quando, subitamente, um carro o atropela. Duas moças deixam o veículo e se aproximam do corpo.

— Eu imaginava. A serviço, como sempre; uma verdadeira workaholic.

— Por favor, Desejo.

— Irmãzinha, se era pra fazer seu serviço...

— Não gosto mais disso do que você. Mas, por mais que essa viagem possa nos unir, não podemos parar nosso trabalho. Você sabe disso, "irmãzinha".

— Ele vai fazer você demorar?

— Ele eu não sei... — a voz de Constantine surge — ... mas eu pretendo tirar proveito desse encontro. Acabo de sair da casa de uma amiga e preciso de informações. Procuro por um livro.

— Este? — a irmã de Desejo ergue o livro que Eliphas carregava.

— Não, este não. Apesar desse também ser perigoso pra mentes frágeis, não é o que procuro.

— Desejo, sabe de algo?

— Na verdade, minha irmã, os desejos e as súplicas para alcançar o poder prometido pelo livro que o mago procura mexem bastante com meu reino. Não é difícil saber onde encontrá-lo.

— E então? — Constantine está ansioso.

— Louisiana.

Em frente à uma pensão barata na Louisiana, o táxi deixa Constantine na porta.

— Fique com o troco.

Caminhando a passos lentos, o inglês chega até a porta do Hotel e, ao abri-la para entrar, quase esbarra em outro homem que está prestes a sair.

— Você? — Stephen Strange não contém a expressão de surpresa.

— Acho que não está muito feliz em me ver, Stephen — rebate Constantine.

A seguir:
Acompanhe o primeiro encontro de Stephen Strange e John Constantine.



 
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