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Por
Eduardo 'Mordred' Viveiros
Caminhos
Distorcidos
Noite
passada
Por um momento, ele hesita.
Hesita e observa a pele firme e quente do garoto desacordado.
Ele passou meses estudando e se preparando para este momento.
O plano era simples, bastava injetar nas veias uma infusão
feita com os fluidos escrotais de um dos muitos jovens que vendem
seus corpos nas ruas. O mais difícil já tinha sido
feito. Por que ele hesita agora?
Mais uma vez, ele cheira o corpo nu à sua frente, perfeito
e sem as máculas do tempo. Como que para reforçar
suas intenções, acaricia a cicatriz onde deveria
estar seu sexo, decepado impiedosamente meses atrás. Lembra-se
dos garotos da vizinhança, que começaram a zombar
quando sua pele albina sentiu os efeitos dos hormônios descontrolados.
Uma zombaria que dói na alma até hoje. Uma zombaria
que logo iria acabar.
Sem pensar em mais nada, ele agarra seu estilete e corta de ponta
a ponta o escroto do garoto desmaiado, recolhendo seu conteúdo.
Seu plano começou.

Tarde
do dia seguinte
Tim Drake está sentado em uma das mesas da biblioteca do
colégio e, enquanto espera seu amigo Kurt Ward, tenta se
concentrar nos livros de trigonometria. Números e conceitos
confundem-se rapidamente em sua cabeça quando escuta trechos
da conversa entre dois estudantes na mesa ao lado. A dupla cochicha,
como numa conspiração, mas Tim não pode deixar
de ouvir.
Isso é nojento, Rick!
Relaxa, Josh. Não tem nada demais. São só
umas bichas velhas que gostam de levar umas dedadas. E 'cê
ainda pode descolar uma boa grana em uma noite.
Não sei não, cara. E se meus pais descobrirem?
Bah, eles só vão descobrir se você deixar.
Eu falo que vou estudar na casa de um amigo e, em três horas,
já ganhei mais do que a minha mesada. Pô, tem até
alguns que gostam de chupar a gente.
Sério?
Tô falando sério! É só fechar os
olhos e pensar naquela gostosa da Courtney, que tu goza rapidinho.
Porra, parece legal. É só aparecer lá,
então?
Nem... Os caras não te conhecem, e você pode se
dar mal. Seguinte: vai nesse endereço e fala com esse cara
que tá aí no papel. Já tem um monte de caras
aqui da escola que fazem esse esquema. É só dizer
que eu te indiquei que não tem galho.
A atenção de Tim é desviada novamente pela
chegada de Kurt.
Oi, Tim. Desculpe a demora. Aquele diabo de professor me segurou
até agora. Podemos ir, se quiser.
Vamos. O carro está lá fora. Ele recolhe os
livros e se dirige para a saída, não sem antes olhar
para Rick e Josh, que continuam conversando.
Algum problema, Tim? Você tá com uma cara estranha.
Não é nada, só estou... preocupado com
a prova. Kurt, posso te perguntar uma coisa?
Manda.
Você tá sabendo de alguma coisa sobre a rapaziada
da escola fazendo programas à noite?
Programas?
É. Prostituição, sexo, essas coisas.
Credo, cara. Não sei de nada. De onde você tirou
isso?
Ouvi alguma coisa. Esquece, devem ser boatos. a situação
começa a incomodar Tim cada vez mais. Ele pode ver claramente
que Kurt está mentindo.

Duas
semanas atrás, ele corria. Corria para salvar sua pele.
Doze horas antes, ele ignorou o bom senso e foi para a cama com
a mulher de Bloody Joe. Todo mundo na vizinhança sabe que
aqueles que mexem com a mulher de BJ se arrependem. Ele também
sabia, mas os meses sem sexo falaram mais alto quando aquela deusa
de cabelos vermelhos lhe deu bola.
Agora, ele pagava o preço. Metade da gangue de BJ corria
atrás dele, aos gritos. Como homens desesperados costumam
cometer grandes burradas, ele entrou em um beco sem saída.
Antes que se desse conta de seu erro, seis homens já seguravam
seu corpo, esperando a chegada inevitável de BJ, que entrou
no beco em seguida. Seus olhos, vermelhos de raiva.
Então, você é o puto que gosta de enrabar
a mulher dos outros? Sem esperar resposta, fez sinal para
que seus capangas arrancassem sua roupa. Você vai
aprender.
Os capangas seguraram seu corpo nu contra o chão sujo,
peito para baixo. A lição foi demorada e humilhante.
A dor se tornou ainda mais presente quando BJ passou o 'turno'
para sete de seus capangas.
Quando ele achou que tudo estava terminado, veio a verdadeira
tragédia. Os capangas viraram-no de frente para BJ, que
sorria e segurava uma grande faca de caçador. Ele ouviu
o criminoso fazer alguma piada, mas não conseguiu prestar
atenção. Tudo o que ele se lembra era da dor lancinante,
misturada com as risadas dos capangas ao redor do beco, enquanto
BJ arrancava lentamente seus genitais.

Alfred
desce a escada que liga a Mansão Wayne à Batcaverna.
O velho mordomo já perdeu a conta de quantas vezes fez
aquele trajeto, carregando sua indefectível bandeja de
prata. Ele poderia confortavelmente usar o elevador secreto instalado
por seu patrão, mas não confia naquelas máquinas.
Odiaria ficar preso em um elevador no meio de uma caverna. Além
disso, exercício faz muito bem para as pernas na idade
dele.
Bruce Wayne acaba de acordar e, antes de almoçar, está
praticando ginástica. O corpo forte de seu patrão
faz Alfred ressentir-se do peso dos anos em seu próprio
corpo. "Inevitável", pensa ele, afastando os
devaneios de sua mente enquanto deposita a bandeja com café
e a correspondência do dia em uma mesa próxima. No
outro braço, uma toalha de algodão, que estende
para Bruce.
Bom dia, Alfred. Alguma correspondência importante?
Um memorando da Waynetech, dois pedidos de caridade e uma carta
daquele seu amigo canadense de nome estranho. E este curioso convite
para a inauguração de uma nova casa noturna na cidade.
Deixe-me ver. Bruce pega o chamativo convite negro
em letras vermelhas. Sodomme?
Pelo visto, o senhor conseguiu um novo lugar para usar suas
roupas de couro.
Muito engraçado... "Venha satisfazer todas
as suas fantasias de forma privativa e segura, em um ambiente
perfeito. Pré-inauguração nesta quarta-feira,
apenas para convidados. Leather obrigatório."
De onde eles tiraram a idéia de que eu poderia me interessar
por algo assim?
Talvez a Mulher-Gato o tenha indicado, patrão.
O diálogo é interrompido por uma chamada no computador
central da caverna.
Batman, você está aí?
Na escuta, Oráculo. Pode falar.
Descobri uma entrega em Gotham que aposto ser do seu
interesse.
Entrega?
Um carregamento clandestino, na verdade. Um grupo de
garotas sul-americanas foi contrabandeada para Gotham há
duas noites. Todas com idade entre 16 e 21 anos. Chegaram nas
docas e foram levadas acorrentadas dentro de um furgão.
Alguns boatos dizem que é para uma nova casa noturna na
cidade. Quando conseguir mais informações, volto
a ligar. Oráculo desligando.
A tela do computador apaga e passa a refletir o rosto de Bruce
Wayne, que deixa transparecer seu asco por tráfico humano.
Pelo visto, devo preparar seus trajes mais cedo hoje, patrão
Bruce.
Sim, mas não os de Batman. Hoje, Bruce Wayne estará
na ativa. Venha comigo, Alfred. Vamos descobrir o que tenho de
couro guardado no armário.

Várias
estradas ligam o Aeroporto Internacional de Gotham ao centro da
cidade. Esta, em especial, percorre as colinas ao sul, onde a
mata original ainda é preservada. Ponto turístico,
o lugar também é popular entre os românticos
e os nostálgicos. E é nostalgia o que toma conta
da ocupante do coupé alugado que passa por ali naquele
fim de tarde.
Ela encosta o veículo no acostamento, desce e apoia-se
no guard rail para admirar a vista. Longe, a cidade se
resume a grandes construções de concreto que parecem
amalgamar-se. A mulher respira fundo e abre um largo sorriso.
Ah, Gotham, mon amour. Sua filha pródiga
está de volta. E, desta vez, é pra valer.

Após
cumprimentar Alfred, Tim Drake sobe as escadas da majestosa mansão
em direção à suíte de Bruce Wayne.
Encontra o parceiro saindo do banho, o quarto tomado pelos vapores
aromados vindos do banheiro.
Vai sair hoje, Bruce?
Sim, uma festa que merece ser investigada. diz Bruce, apontando
o convite sobre a cama.
Sodomme? Tim olha o convite com um sorriso
irônico Não sabia que você curtia um
bondage...
Uma só piadinha sobre acessórios de couro e eu
arrumo um novo parceiro... Oráculo encontrou indícios
de tráficos de garotas para serem leiloadas nesse clube.
Parece que perversão sexual é a bola da vez. O
que vim comentar com você está nessa roda também.
O que é?
Uma coisa que ouvi na escola. Ao que parece, tem alguém
assediando garotos da minha idade para prostituição.
Então a situação é mais grave do
que parecia...
Você já sabia?
Estive de olho nisso nas últimas semanas. O número
de garotos de programa na cidade aumentou, e a idade é
cada vez menor. Só não sabia que estavam recrutando
na classe alta também.
É o que parece. Enfim, como você já está
ocupado, vou investigar essa sozinho.
Nem pensar. diz Bruce, saindo do banheiro.
Como assim?
Essa gente é perigosa, Robin. Não quero você
correndo riscos desnecessariamente.
Mas que diabos, Bruce! Eu sei me cuidar. Os garotos...
Os garotos não estão sendo forçados
a nada. interrompe Bruce, adotando um tom ríspido.
Todos entraram nessa situação por vontade
própria. As garotas no Sodomme precisam de ajuda
mais imediata. Mantenha-se longe disso, Robin. É uma ordem.
Bruce deixa o quarto, enquanto Alfred entra.
O que aconteceu agora? pergunta o mordomo.
Esse comportamento superprotetor de Bruce extrapola o bom senso,
às vezes. Ele precisa enfiar na cabeça que não
sou Jason Todd!
Ah, sim. Infelizmente, patrão Bruce não é
do tipo que supera seus traumas facilmente. Já que Robin
vai ficar de molho esta noite, não poderia ajudar-me a
arrumar a coleção de CDs, patrão Timothy?

Alguns
dias atrás, quando Pacheck, o médico, deu a ele
esperanças de recuperar sua identidade perdida. Ele se
lembrava nitidamente da conversa.
... implante é inviável, infelizmente. Uma
prótese pelo plano de saúde da prefeitura pode demorar
meses para ser aprovada. Acho que o senhor vai ter que se acostumar
com sua... situação por enquanto.
Tudo bem, doutor, já estou conformado. O senhor
tinha falado algo sobre hormônios...
Sim, hormônios. Como o senhor bem sabe, com essa...
hã... intervenção nos seus genitais, seu
sistema hormonal vai ficar completamente desequilibrado. Portanto,
será necessária a complementação de
testosterona, com estes comprimidos. Tome um comprimido por dia,
e pode ficar sossegado. Mas não se assuste com algumas...
alterações físicas no seu corpo. Infelizmente,
elas são inevitáveis, mesmo com os hormônios.
Certo, doutor. Preciso ir agora. Nos vemos semana que vem.
Ele já sabia o que fazer desde então. Não
precisava daquele vidro estúpido de comprimidos brancos.
Ele ia direto à fonte.

O nome
Sodomme, escrito em neon vermelho na fachada, é
refletido nos vidros escuros da limusine. Dentro do veículo,
Bruce Wayne prepara-se para adotar um papel que não incorpora
há tempos: o dele mesmo, o playboy despreocupado
com a vida. No banco da frente, Alfred, com seu uniforme de chofer,
fala:
... às duas em ponto, senhor. Divirta-se.
É pouco provável, Alfred. Até mais tarde.
Bruce sai do carro, chamando a atenção dos poucos
presentes na calçada. O collant inteiriço
de couro ressalta seu corpo forte, cobiçado por boa parte
da sociedade gothamita. Sem dar atenção a ninguém,
dirige-se naturalmente à porta, onde é barrado por
um segurança mal-encarado, de terno preto.
Calma aí, bacana. A festa é restrita hoje.
Sei bem, amigo. Você deveria ter me reconhecido, se estivesse
inteirado com o trabalho para o qual foi contratado. Eu fui convidado.
Meu nome é Wayne. Bruce Wayne. a frase faz o segurança
arregalar os olhos.
Perdão, senhor Wayne, não o reconheci. O senhor
é um dos convidados de honra. Por favor, entre e aproveite
a noite.
O ambiente que Bruce encontra não é muito diferente
do que esperava. A decoração é inspirada
em objetos de tortura da época da Santa Inquisição.
Donzelas de ferro, máscaras de tortura e outros apetrechos
estão espalhados pelo salão, à disposição
de quem quiser utilizá-los. Garçonetes e barmen
estão vestidos com explícitos trajes de couro e
coleiras. Em pequenos palcos suspensos, homens e mulheres assumem
o papel de torturadores, com chicotes e outros objetos, disponíveis
para quem quiser passar por uma pequena humilhação
prazerosa.
A observação de Bruce é interrompida quando
uma das atendentes leva um homem de terno e gravata para uma sala,
fechada por uma cortina púrpura. Quando tenta entrar, sua
passagem é interrompida por um dos guardas, seu corpo grande
e peludo coberto por pequenas tiras de couro.
Por favor, senhor. Este ambiente é de acesso restrito.
Quando se prepara para responder, Bruce é interrompido
por uma mão firme que toca seu ombro, dizendo:
Bruce Wayne? ele se vira e dá de cara com um homem
alto e magro, de roupa cinza, gel e óculos escuros. O sotaque
e o sorriso italianos são inegáveis Meu nome é
Pablo Dominiguetti, responsável pela casa. Muito prazer.
Então você é o proprietário? os
dois homens dão-se as mãos e sorriem. O cinismo
é palpável.
Dono, não. Apenas responsável interino. Neste
ramo, a diferença é considerável. E então,
gostando do nosso serviço?
É... interessante. Na verdade, nem deveria estar aqui,
pois viajo para Aspen em uma hora. Mas a curiosidade foi mais
forte.
Entendo. o sorriso de Pablo começa a incomodar Bruce.
E curiosidade, pelo visto, o senhor tem muita. Gostaria de conhecer
os ambientes privativos que oferecemos?
Claro, por que não?
Para o senhor, tudo é possível, senhor Wayne,
como membro honorário da nossa Sodoma particular. Por favor,
acompanhe-me.
Os dois homens ultrapassam a cortina púrpura e passam para
outro corredor, de formato arredondado. Ao longo das paredes,
pequenas aberturas cobertas por outras cortinas deixam transparecer
os gemidos molhados de seus ocupantes, interrompidos ocasionalmente
pelo som do couro de um chicote arrebentando a carne.
Estas são nossas dark rooms privativas. Todos
os funcionários da casa, desde as garçonetes até
os seguranças, estão disponíveis para realizar
as fantasias de nossos sócios. Todos fazem testes regulares
contra HIV e doenças venéreas, e sofrem cirurgias
para deixar de serem férteis. Ou seja, filhos e vírus
indesejáveis são coisas que o senhor não
vai encontrar aqui.
Caminham mais um pouco, até o fim do corredor escuro. Param
em frente a um portão enferrujado, fechado por um grande
cadeado, que é rapidamente aberto por Pablo, com um sorriso
malicioso no rosto.
E aqui, a prata da casa. Acompanhe-me.
A visão é terrível. O portão bloqueava
a entrada de uma pequena caverna circular, esculpida na pedra,
com infiltrações de água por toda parte.
O chão é coberto por palha e serragem. Encolhidas
pelos cantos, doze adolescentes olham assustadas para os dois
homens.
Elas são nosso espólio, e serão leiloadas
daqui a duas noites para nosso sócios. Todas virgens com,
no máximo, 18 anos. O melhor que a humanidade selvagem
pode oferecer. Se o senhor quiser experimentar alguma, podemos
abrir uma exceção. É só escolher.
Antes que Wayne possa responder, uma das garotas joga-se a seus
pés, choramingando em espanhol:
Por favor, señor, não me machuque. Queremos
apenas ir para casa, ajude-nos...
Cala-te, Maria! E faça o que foi treinada a fazer.
Pablo gritou, também em espanhol, no mesmo tom
usado para cachorrinhos que fizeram suas sujeiras no lugar errado.
Ainda choramingando, mas resignada, María levanta-se e
abraça as coxas de Bruce, apertando suas nádegas
e lambendo seus genitais proeminentes sob a roupa de couro. Abalado,
Bruce afasta a garota gentilmente, e fala para Pablo:
Eu.. adoraria experimentar o que me oferece, mas tenho aquela
viagem que lhe falei. Realmente preciso ir.
Uma pena, senhor Wayne. Pablo pega um cartão do bolso
de sua roupa e entrega a Bruce Aqui está o convite para
a festa a fantasia de sexta, que será acompanhada pelo
leilão das garotas. Esperamos sua presença.
Eu estarei aqui, com certeza. Até logo.
Deixando Pablo para trás, Bruce sobe o corredor disposto
a deixar a casa o quanto antes. Um ódio selvagem queima
sua alma.

O
nome do garoto é Kurt. Ao menos, é o que diz a identidade
achada no bolso de trás do jeans. Kurt Ward. Enquanto carrega
o corpo inerte para a banheira do motel, ele pensa em papai e
mamãe Ward, e na reação dos dois quando souberem
da notícia. Sem se surpreender, ele não se importa.
No quarto, o fogareiro arde.
Seu plano está indo perfeitamente bem.
:: Notas do Autor
Olá. Bem vindo ao sombrio mundo de Batman. :)
Este é apenas o primeiro número de uma jornada audaciosa,
que pretende se estender por um bom tempo. Talvez nem sempre agradando,
mas sempre encarando temas estranhos, bizarros e nojentos. Temas
presentes na vida de qualquer um de nós.
Espero que vocês tenham se divertido lendo tanto quanto
eu me diverti escrevendo e imaginando a cara de vocês enquanto
liam. Portanto, utilizem o formulariozinho aí abaixo para
eu saber suas opiniões. Qualquer grunhido serve, e não
dói nada.
Até o próximo número então.
Mordred
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