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Matrix / Flash Especial

Por Rafael 'Lupo' Monteiro

Abrindo as Portas da Percepção

Quem somos? De onde viemos? Para onde vamos? Perguntas como estas sempre são feitas por todos nós em determinados momentos da vida. Quem nunca olhou para um céu estrelado e se perguntou sobre o papel da vida humana dentro de um plano maior? Existe Deus? Existe o livre-arbítrio? Será que somos realmente livres? Perguntas sem respostas, muitos diriam. Mas há uma resposta para tudo isto: Matrix.

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A chuva cai pesada na noite de Sábado em Keystone City. Em um apartamento abandonado no centro da cidade, um telefone toca. Das linhas telefônicas, visitantes que não são deste mundo chegam. São homens vestidos de negro; e hoje eles têm uma missão: encontrar Wally West, também conhecido como o Flash.

O herói neste momento encontra-se na casa de sua namorada, Linda. Eles pretendem jantar fora, mas para isso é preciso que ela primeiro decida que roupa irá vestir.

— Linda, você vai ficar bem de qualquer jeito! — diz Wally, impaciente, sentado no sofá da sala. Ele balança o pé, inquieto.

— Não vou, Wally! Hoje estou horrível, não consigo combinar nada. Eu ia usar meu vestido branco, mas com essa chuva, nem pensar! Se me molhar já viu, né? Ou melhor, os outros é que vão ver o que não devem! — ela grita do quarto, com aflição na voz.

— Isso não é problema! Chegaremos lá tão rápido que nem vai dar tempo dos pingos nos atingirem.

— É, você tem razão! Sabe, até que é prático ter um namorado super-herói de vez em quando...

Ambos dão risadas da pequena brincadeira. Neste instante, o telefone toca. Antes do primeiro toque terminar, Wally já atendeu a chamada.

— Alô?

— Wally West?

— Sim, pois não?

— Aqui é do corpo de bombeiros, está ocorrendo um incêndio no centro da cidade, e queria saber se...

— Já estarei aí!

Wally corre, beija o rosto de Linda, diz que volta num piscar de olhos, e em menos de um segundo já rodou todo o centro da cidade. E não achou um único foco de incêndio.

No topo de um prédio, um negro careca, forte, usando óculos escuros e uma roupa negra de couro fala pra sua companheira, uma mulher branca, de olhos verdes e cabelos negros, também vestida com roupas de couro:

— Ele está aqui, traga-o até a mim.

A mulher pula, o prédio tem poucos andares. A rua está deserta e neste momento Wally passa por lá pela terceira vez. Ele pára e olha a mulher nos olhos.

— Foi você quem me ligou?

— Siga-me!

Ela abre a porta do prédio, esperando-o. Wally fica parado, e pergunta:

— O que você quer de mim? Pra que o trote?

— Todas as suas perguntas serão respondidas no topo do prédio.

Ele reluta, mas decide subir. Antes de a mulher piscar os olhos, ele já está no topo, encarando o negro.

— Boa noite, Wally!

— Quem são vocês, afinal? O que querem de mim?

— Super-heróis são sempre escoteiros, dedicando suas vidas a manutenção do status quo. Nunca se perguntam sobre qual é o seu verdadeiro papel neste mundo. — o negro diz, em um tom didático, com um sorriso de vitória disfarçado nos lábios — Nem imaginam que na verdade são programados para fazer o que fazem... vocês poderiam ser muito mais do que são...

— Se você me chamou pra fazer um discurso, pode parar por aqui mesmo. — diz Wally, impaciente.

— O que você diria se eu te dissesse que toda a atividade super-humana foi criada unicamente para desviar a atenção das pessoas do que realmente interessa?

— Diria que você é mais um louco com mania de brincar de teoria da conspiração!

— O que é a realidade, senhor West? Você tem idéia do por que estamos aqui? Quem somos, para onde vamos? O que existe por trás das nossas vidinhas comuns? — o negro faz uma pausa dramática, para depois perguntar — Você sabe o que é a Matrix?

— Matrix... eu já a vi em sonhos... mas não consigo lembrar o que é. — o negro por um momento consegue confundir o super-herói.

— Todos intuímos que há algo além disto aqui. — diz o negro, com os braços abertos apontando para o horizonte — Você pode saber a verdade, mas para isso terá que tomar esta pílula azul. Se não quiser, tome esta pílula vermelha, e irá esquecer deste nosso encontro.

— Não tão rápido, amigo!

Neste instante, sorrateiramente, a mulher reaparece, e, escondida, dispara de uma pistola com um silenciador um projétil que atinge a nuca do herói. Ele cai no chão, sem conseguir se mover, e antes de perder a consciência ainda ouve o homem lhe dizer:

— Iremos nos encontrar novamente quando estiver preparado!

Wally acorda com um gosto ruim em sua boca, uma sensação indefinível, algo que é ao mesmo tempo ácido e amargo. Ele está em sua cama, mas não se lembra de como foi parar ali. Olha o relógio, são 10:23 da manhã. Ainda está com sono, tenta voltar a dormir, rola na cama, mas não consegue relaxar. Faz exercícios de respiração, inspira e expira lentamente, de olhos fechados, tentando relaxar seu corpo. Depois de um tempo, começa a ouvir vozes em sua cabeça. Elas dizem coisas como "Você é um herói, não pode fazer isso!", "Linda não gostaria que você fosse assim!", "O que seu tio Barry iria pensar de você se o visse agora?". Por fim, Wally desiste de dormir.

Ele levanta-se, arruma a casa em menos de um minuto. Depois, corta uma fatia de queijo e outra de presunto para comer com pão, o que faz em cinco décimos de segundo, o mesmo tempo que leva para tomar um copo de leite. Depois vai ao banheiro, enche sua escova de dentes de pasta de cor verde e a esfrega compulsivamente na boca, tentando tirar o gosto ruim com que acordou. Mas o gosto parece cada vez ficar pior e ele escova ainda mais freneticamente, até causar um pequeno ferimento no lábio superior. Ao cuspir a pasta de dente, tem a impressão de ver pequenas letras dentro delas. Ele mete a mão no resto de baba que ainda está na pia e certifica-se de que aquilo é realmente a baba. Wally olha-se no espelho, mas no lugar de ver seu banheiro, vê apenas um fundo negro e os objetos aparecem todos verdes, formados por pequenos símbolos também verdes. Wally fecha os olhos e pensa:

"Não estou louco! Vou abrir meus olhos e tudo irá voltar ao normal!"

E quando ele abre os olhos, tudo realmente volta ao normal.

Ao ligar a TV, Wally vê a notícia de que estão assaltando um banco no centro da cidade.

"Mas peraí, hoje não é domingo?" — ele pensa. Mesmo meio confuso, veste-se como Flash e corre para o banco.

Ao chegar no centro, o trânsito está todo parado. Em frente ao banco, a polícia tenta negociar. Uma lufada de vento passa por eles. É o Flash entrando no banco e retirando as armas de todos os ladrões antes que eles possam piscar.

— Se vocês queriam dinheiro para as férias, tenho uma boa notícia: vocês acabaram de ganhar uma viagem de graça para a cadeia mais próxima, e todos os dias vão ter a oportunidade de verem o Sol nascer quadrado! — ele graceja, dando como certa a captura dos bandidos.

— Não tão fácil, desgraçado! — um dos ladrões tinha uma arma reserva, e agora ele atira a esmo, só para descontar a raiva que está sentindo.

O Flash corre e consegue retirar a arma da mão do bandido, e depois corre para pegar as balas. O maior problema é localizar cada uma delas.

"Foram três ou quatro tiros?" — ele se pergunta.

Localiza a primeira e pega-a antes que atinja a cabeça de um dos reféns. A segunda e a terceira não atingiriam ninguém, mas ainda assim ele as pega, por via das dúvidas. Mas a quarta ele não consegue pegar. Um dos reféns é atingido no peito. O Flash corre, e ainda consegue ver a bala penetrando no peito da vítima, um homem de uns quarenta anos, parcialmente careca, com uma barriga avantajada. O herói segura o homem antes que ele caia no chão e corre até o hospital mais próximo para salvá-lo.

Durante a corrida, ele volta a ter visões estranhas, todos os carros, todas as pessoas, todos os objetos, tudo vira apenas dados de computador nesta visão. Até o sangue do homem baleado em seus braços parece ser feito por esses dados. E para encurtar o caminho, ele simplesmente atravessa os objetos na rua, criando uma onda de impacto que causa um pequeno terremoto na cidade, sem perceber. Ele finalmente chega ao hospital, deixa o ferido, e volta ao banco para prender os assaltantes.

Wally não sabe o que fazer. Ele sobe em cima do telhado de um prédio no centro da cidade. Lá de cima, ele vê as pessoas correndo para seus trabalhos, todas estressadas, ocupando o tempo de suas vidas com coisas que não querem fazer e não percebem o quanto desperdiçam suas vidas. Neste instante, a visão volta, todos são feitos de elementos de linguagem de computador mais uma vez. Wally acha que está simplesmente enlouquecendo.

— Linda, algo estranho está acontecendo! — Wally entra na casa da namorada quando esta ainda está preparando o almoço. O cheiro de fritura é forte e os hambúrgueres já estão quase prontos.

— Com certeza está! — ela responde irritada — Você some por dois dias sem me dar nenhuma satisfação. Achei que desta vez um dos seus inimigos tinha conseguido te pegar de vez!

— Eu estou tendo visões... não sei mais o que é real ou não... Linda, o que é Matrix?

— Que tipo de pergunta é essa? — ela diz, espantada.

— Você nunca se perguntou isso? Nunca viu isso em seus sonhos?

— Eu trabalho muito, chego cansada, não tenho tempo pra perder lembrando meus sonhos! Acho que você não está bem mesmo...

— Sabe, Linda, eu apaguei esses dias. Nos meus sonhos, algo me dizia que iria encontrar a verdadeira liberdade, não a liberdade de escolher entra uma Pepsi ou uma Coca, mas a verdadeira liberdade! — Wally está visivelmente exaltado.

— Wally, calma, quem está ficando confusa sou eu... você não está dizendo coisa com coisa...

— Linda, me dê um beijo!

Mesmo assustada, ela aproxima-se do noivo e lhe dá um beijo. Wally fecha os olhos e recebe o beijo desejado. Mas ele sente novamente algo errado. Quando ele abre seus olhos, vê apenas dados se mesclando, no que deveria ser um beijo. Ele se assusta e, quando percebe, as moléculas de seu corpo estão vibrando e fundindo seu corpo ao de sua amada. Ela olha apavorada, sem saber o que fazer. Wally tenta se concentrar, fecha os olhos novamente e tenta separar seus corpos. Mas as vozes em sua mente voltam, "Você não pode fazer isso, Wally!", "Você vai estragar tudo!". Wally respira fundo, ignora as vozes, e controla a vibração de suas moléculas, até finalmente separar seu corpo do de Linda.

— Wally, o que está acontecendo? — ela pergunta, chorando.

— Não sei... Linda, irei sumir por um tempo... não me procure, mas não se preocupe também, tudo dará certo!

Ele some, e Linda fica parada, de boca aberta, sem entender nada do que está acontecendo.

Índia. Desde que a China adotou o regime comunista, este é o novo lar do Dalai Lama e seus templos budistas. É em um deles que se encontra Wally West.

Wally fugiu de tudo, e agora, dentro de um quarto úmido e apertado, tenta se achar. Ele está meditando por 48 horas seguidas, sem beber ou comer, sem ao menos se levantar. Para um homem acostumado a viver entre os intervalos de segundo, 48 horas é quase uma eternidade.

Ele observa as montanhas no horizonte. A neve que as cobre não é neve. As rochas que as mantêm de pé não são rochas. As roupas que veste não são roupas. O ar que respira não é ar. A Iluminação finalmente chega a Wally West. Tudo é uma ilusão, tudo é criação do grande Demiurgo que cria e controla a vida. Tudo é obra de Matrix.

— Finalmente você percebeu? — o negro careca reaparece no templo, como se soubesse onde iria achar Wally. Ele continua vestindo couro preto e óculos escuros, como sempre.

— Olá! Esperava por você! Veio me buscar? — diz Wally, serenamente.

— Sim! Pelo visto, você já alcançou a iluminação.

— E nem precisei da pílula! — ambos sorriem.

— E então, você vem comigo?

— Sim! As pessoas precisam ser acordadas. Estão presas as suas vidinhas sem graça, ao seu mundinho onde nada de novo acontece, e acham que tudo deve ser assim mesmo... são presas fáceis para o controle, e nem percebem como a vida pode ser maravilhosa... basta apenas querer se libertar!

— Venha comigo! — diz o negro, segurando a mão de Wally e levantando-o — Temos muito trabalho pela frente!



 
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